"Quero fazer da minha existencia lesbica feminista a produção crítica de mim mesma e do mundo!"

(frase criada por várias lésbicas feminista do Brasil- Marylucia Mesquita, Luanna Marley, Kaká Kolinsk...)

domingo, 15 de novembro de 2009

O primeiro e único selo editorial da América do Sul especializado em publicações para lésbicas completa um ano


* Extraído na íntegra do site: www.estadao.com.br/noticias/suplementos,uma-editora-engajada,465997,0.htm , acesso em 15/11/2009 às 15h


Uma editora engajada
Ciça Vallerio - O Estado de S. Paulo

PIONEIRISMO – Hanna (esquerda) e Laura comemoram o lançamento do quarto livro da Malagueta A Malagueta é um empreendimento de lésbicas para lésbicas. Este é o mote da única editora da América do Sul que publica livros voltados só para mulheres homossexuais. Após um ano de existência do negócio, as sócias Laura Bacellar e Hanna Korich se preparam para lançar este mês o quarto título e comemorar o resultado dessa empreitada.

"Já participamos de várias feiras do livro, fizemos encontros literários em muitos estados, firmamos parcerias com livrarias independentes e, o mais importante, estamos contribuindo para a ampliação da cultura lésbica, que é uma maneira de erradicar o preconceito", avisa Laura, de 49 anos, respeitada profissional do mercado editorial, com passagens pelas principais editoras do País. Foi ela que lançou o selo GLS, criado dentro da Summus, e o primeiro do País dedicado às minorias sexuais.

Quando Laura fala em "ampliar a cultura lésbica" significa aumentar a visibilidade das homossexuais para que essas mulheres possam ser aceitas cada vez mais pela sociedade e por elas próprias. "Ao contrário dos homens gays, fomos ensinadas a ficar quietas", ressalta. "Mas a nova geração já começa a mudar isso, tornando-se menos invisível. Mesmo assim, tudo o que é produzido na nossa cultura só é pensado para as mulheres heterossexuais, apesar de pesquisas do porte do Relatório Kinsey revelarem que 10% das mulheres são lésbicas."

Um exemplo dessa disparidade está no próprio mercado editorial do Brasil, que comporta entre 20 mil e 50 mil títulos por ano. No entanto, de tudo o que está nas prateleiras das livrarias apenas 75 abordam a temática lésbica, conforme levantamento realizado por Laura Bacellar. E como esses poucos títulos não são divulgados, a Malagueta comercializa também livros de outras editoras que tratam do tema lesbianismo e costumam passar despercebidos entre as pilhas de lançamentos.

Os três livros editados pela Malagueta já fizeram a alegria de autoras brasileiras que encontraram um canal de divulgação e comercialização de seus romances. O primeiro foi As Guardiãs da Magia, de Lúcia Facco. Depois vieram Amores Cruzados, de Fátima Mesquita; e Shangrilá, de Marina Porteclis. Este mês, vai entrar na lista o Aqueles Dias Junto ao Mar, escrito por Karina Dias, que se tornou um frisson na internet e agora chega na versão impressa, reescrita e com um novo final.
CONTRA O ESTIGMA – Para a escritora Karina, quanto mais se fala sobre o tema, menor o preconceito

Em todas as publicações, as histórias falam de amor e sexo entre mulheres. As sócias avisam: "Os textos são um pouco apimentados, mas não trabalhamos com pornografia." Outra particularidade do selo Malagueta é o formato de bolso dos livros, que recebem contracapas lilás (cor que representa os homossexuais), para que suas leitoras tenham privacidade na hora de ler em lugares públicos. Mais uma curiosidade: o símbolo da editora são duas sapinhas, o que dá um toque de humor (para quem não sabe: "sapa" é um apelido popular para lésbica).


HAPPY END
Diferentemente de romances lésbicos publicados no passado, os livros lançados pela Malagueta têm direito a final feliz, embora isso não seja um requisito para a sua publicação. Para se ter uma ideia, as personagens da escritora Cassandra Rios, uma das precursoras da literatura lésbica no Brasil em plena repressão dos anos de 1970, eram amargas, bebiam muito e sofriam com o amor impossível.

Apenas em 1999, surgiu o primeiro livro brasileiro que falava do amor entre duas mulheres com final feliz. Foi Julieta e Julieta, escrito pela mineira Fátima Mesquita, que atualmente mora no Canadá. Apesar do estigma, as poucas publicações que tratam da homossexualidade feminina ajudam a entender e a aceitar a condição sexual de muitas que enfrentam barreiras na sociedade. Foi o que aconteceu com a própria Hanna, de 52 anos, que, junto com Laura, inaugurou a Malagueta.

"Os livros são fundamentais para tirar dúvidas, fazer as pessoas conhecerem o universo homo de uma forma serena", acredita Hanna. "Eu tive dificuldades para me aceitar, porque vivia em um universo profissional cheio de preconceitos, que era o de advogados, além do ambiente familiar. Foram os livros que me ajudaram a ter compreensão de mim mesma. Pensando na minha trajetória, entrei nesse projeto para que outras tenham a mesma oportunidade que eu tive."

Depois de várias décadas, Hanna assumiu publicamente sua homossexualidade e seu relacionamento de cinco anos com Laura, sua sócia.

A escritora Karina Dias, autora do quarto título da Malagueta, não sofreu preconceito quando assumiu sua condição sexual aos 18 anos. Porém, a maioria de suas leitoras lésbicas, que acompanha suas histórias publicadas na web, sente muita dificuldade para lidar com a sexualidade.

"Várias só conseguem viver o amor delas na internet, lendo os romances e contos que escrevo", conta a carioca Karina, de 30 anos, que estuda Jornalismo e se mudou para São Paulo, com o objetivo de morar com sua companheira paulistana. "Uma editora específica para esse nicho é importante, pois mostra, por meio de suas publicações, que é possível ser feliz. Além disso, a partir do momento em que se conhece mais sobre esse assunto, os estigmas e preconceitos vão se diluindo naturalmente."

Além das leitoras, muitas autoras também não se sentem à vontade para se expor. Por isso, acabam usando pseudônimos, como observa a carioca Lúcia Facco. Ela está finalizando a segunda parte do seu livro As Guardiãs da Magia, lançado pela Malagueta. Mas bem antes desse título, publicou outros com temática lésbica.
"Quanto mais se fala, mais se desmistifica o tema", ressalta Lúcia, que é mestre em Literatura Brasileira e doutora em Literatura Comparada pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro. "É importante que as pessoas saibam que não vivemos em gueto, que não ficamos fazendo sexo 24 horas por dia. Tem sexo sim, mas também há muita afetividade. Aliás, é o tipo de literatura que não é preciso ser lésbica para ler. Do mesmo jeito que não é necessário ser polícia para ler uma história policial."

Um comentário:

Helenilda disse...

ótima matéria e queria saber onde comprar esse livro preciso ficar por dentro de todas situações que eu vivo.
Helenilda